Há algum tempo, quando ainda estava na minha graduação em Psicologia, me debrucei sobre a leitura de “A transitoriedade” (1916), de Sigmund Freud. Tal texto, embora pequeno e singelo, carrega consigo uma belíssima mensagem, que toca a muitos de nós profundamente. Ele aponta, dentre outros aspectos, para o fato de que a transitoriedade do belo não implica na sua desvalorização; muito pelo contrário, significa uma valorização ainda maior.
Através dessa ideia pude ver a mim mesma, que na época atravessava os meses finais da faculdade e começava, por assim dizer, a me despedir do lugar e das pessoas que por cinco anos fizeram parte de meu cotidiano. Um belo caminho foi percorrido, permeado por grandes encontros, desencontros e descobertas. Por meio do estudo teórico, novas ideias e pensamentos que muito me agradaram, e também diversos outros sobre os quais pude tecer críticas e me posicionar contra, foram alcançados. Mas foi com a prática profissional, e sobretudo com a prática da clínica analítica, que vi desabrochar diante dos meus olhos a beleza desse campo do saber e pude saborear a alegria de se fazer o que se ama.
O adeus, não somente para mestres e outros profissionais, mas também para pacientes que venhamos a acompanhar durante algum tempo, pode tornar-se uma experiência de separação e igualmente uma espécie de luto. Luto pela perda daquilo a que nos afeiçoamos e criamos laços; afinal, nenhum encontro acontece sem deixar uma marca- mesmo que mínima e, aparentemente, imperceptível. A certeza da necessária transitoriedade desse período, contudo, não ofusca a sua beleza, e nem mesmo faz com que a experiência se torne amarga. Na realidade, traz alegria e vitalidade ao coração, fazendo com que o valor atribuído a cada etapa do caminhar seja cada vez maior.
Enfim, não deixamos de apreciar uma rosa no auge do seu desabrochar pelo simples fato de saber que, após o ápice de sua beleza, ela murchará e suas folhas cairão. Da mesma forma, um pai não deixa de olhar com ternura para o rosto corado de seu pequeno filho sabendo que em algumas décadas as marcas de expressão surgirão e a jovialidade dará lugar ao cansaço. Há aí algo que ultrapassa a todos nós, uma certa consciência que traz mais encanto para a efemeridade do cotidiano na vida.
Texto por Maria Eduarda Thomaz Cunha Vieira
Aluna e praticante do Instituto Gradiva de Psicanálise
Referência:
FREUD, Sigmund. Introdução ao narcisismo, ensaios de metapsicologia e outros textos (1914-1916). Obras completas, v. 12. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.